12 junho 2005

testemunhos


Dei comigo a pensar na morte com a suavidade de um rio que escorrega lento para o Mar e para as nuvens.
A morte só tem sentires quando olhada individualmente. Consuma-se quando o indivíduo perde a memória e se transfere para a memória dos vivos. Sem ela não haveria eternidade, porque não haveria transferência. Tudo o que existe, no desfazer-se, demora memórias, mesmo uma pedra quando se fragmenta em pó trespassa as suas lembranças. São elas que desenham a continuidade e puxam a vida num novelo encruzilhado de linhas infinitas. Não é uma fronteira, nem um fim. Está muito longe de ser um fim, mas um caminho, como se fosse uma corrida de estafetas onde o objectivo é passar o testemunho. A meta só interessa ao conjunto, não ao indivíduo. O rio pára, mas no seu reflexo, ali está a fervilhar de vida a transpirar-se nuvem, a evaporar-se em memórias-de-gotas-semente. Dei comigo a desviver-me numa contabilidade estranha de perceber onde afinal me encontro nesse fio contínuo de não ser só o eu, mas todas as memórias que carrego num desenho que não me cabe na tela…

1 Comments:

Blogger Lyra said...

tantas vezes me pergunto se é um principio ou um fim.

15 junho, 2005 02:00  

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